Outra vez ?! - perguntarão alguns, achando estranha a persistência de mais do mesmo, quando há tantas alternativas por esse mundo fora, e quando nem sequer é a fé que move a maioria de nós. Sim, outra vez e outra porque nunca é igual, a não ser o companheirismo, a boa disposição e um " je ne sais quoi" que paira no ar...
Não andámos sempre a caminhar, não. Fomos e viemos de autocarro, e pelo caminho até de baloiço se andou! Mas foram 66 km de caminhada, alguns troços bem difíceis, em que quase ficaram as unhas dos pés em terras galegas! Terras que, a bem da verdade, deveriam ser portuguesas, fazia muito mais sentido em termos de geografia, de identificação e de sentimento.
Na vila de Negreira, de origem medieval, não visitámos o Paço Cóton, nem a Capela de S. Mauro, nem o Paço da Chancela, com o seu escudo onde figura a ponte Maceira. Esta ponte está partida ao meio para, segundo a lenda, impedir os soldados de perseguirem os discípulos de S.Tiago. Esta vila é o maior município que atravessámos no nosso caminho até ao Cabo Finisterra. Hemingway fala de Negreira no seu romance "Por quem os sinos dobram".
Não tivemos chuva no primeiro dia de caminho, só bruma, paisagens lindíssimas apesar do nevoeiro, e por aí fora, Zas, a Pena, Villaserio, o Cornado, as Maronas até Santa Marina, onde nos albergámos na casa Pepa, gratos ao Paco e à Flora pela sopa de lentilhas, pela lareira acesa e pela simpatia.
E no segundo dia Ponte Olveiroa, Corzon, Olveiroa até Logoso, aí sim com chuva por vezes a sério. À tarde, após almoço em Ezaro , no restaurante Mar e Sol - o primeiro era perfeitamente visível mas o segundo não apareceu - fomos à cascata de Ezaro, onde, para espanto de todos os visitantes, dois peregrinos do nosso grupo resolveram mergulhar!!
As peripécias do jantar e do serão adivinham-se... fomos aquartelados numa pequena sala porque o refeitório estava ocupado com um comício de um partido político espanhol.
Terceiro dia e o espírito em alta, partida de Logoso, passando pela Playa de Estorde até Sardinero de Abajo. Aqui foi difícil...entrámos no tobogã galego, coeficiente de dificuldade alto! Parámos em Cee para almoçar e foi nesse instante que uma das peregrinas contou as unhas dos pés... e vá lá, ainda estavam todas! Seguimos viagem com menos um elemento para cumprir a etapa da tarde.
No quarto dia fizemos de Sardinero de Abajo até ao Cabo Finisterra, passando por Playa da Langosteira e Finisterra. E sim, era 25 de Abril. E sim, tivemos cravos vermelhos, e os galegos a cantarem connosco a "Grândola, vila morena", abraçados a nós, e cantámos essa mesma canção na bibliotaberna Santa Galeria em Finisterra, onde deixámos uma esferográfica do SMZC. E chegámos TODOS ao km zero, com os cravos vermelhos. E ali estava Fisterra, o fim da terra, que não é o fim de nada, nem da terra, nem dos sonhos, nem das vontades.
Ao fim de 66km merecíamos visitar o Santuário da Virxe de la Barca e depois parar para um tranquilo almoço em Muxia, no restaurante Lonxa d'Alvaro, onde encontrámos mais uma vez o Paco e Lola!!
Até para o ano, camaradas! E venham mais cinco!!
Texto: Manuela Sucena